Boa tarde, leitores!
Conto novo saindo em 3...2...1...
Autor: Luciano S.Vellasco
Twitter: @lucianovellasco
Ano de 1191.
Cavalgamos por
quase dois dias ininterruptos pelas estradas ao sul da terra sagrada. Eram
tempos difíceis aqueles. Os muçulmanos ainda controlavam Jerusalém e a guerra
da Terceira Cruzada parecia não ter fim. Nós, cruzados, havíamos recebido a
sagrada missão de recuperar Jerusalém. Até o momento estávamos indo bem em
nossa campanha. Poucos dias antes conquistamos a cidade de Acre, que fica a
apenas trinta milhas da cidade santa. Pela primeira vez em muitos anos consigo
ver o fim dessa loucura. Tudo o que eu quero é voltar para os braços da minha
amada e de meu filho. Por nossos serviços, recebemos permissão Papal para
retornar às nossas casas a fim de sermos chamados apenas em caso de extrema
urgência. Porém, antes, tínhamos de realizar uma última missão.
- Santo Padre,
realizaremos a missão como o senhor ordena – eu garanti e beijei o anel de ouro
de Sua Santidade.
- Por favor,
tragam-no são e salvo. Há com ele informações preciosas sobre o paradeiro de
relíquias sagradas que foram tomadas de nós – pediu o Papa Gregório VIII. – Vão,
cavaleiros, e que Deus guie seus caminhos – desenhou o sinal da cruz no ar e
nos dispensou.
Então aqui
estamos, procurando Gregor, primo de Sua Santidade. Era para ser apenas uma
missão de reconhecimento e escolta, então viajamos somente com o que era
estritamente necessário para a jornada. Quanto menos peso, mais rápido
chegaríamos a nosso destino. Essa era a visão de Sua Santidade, da qual não
compartilhei. Mas ordens são ordens. A contragosto, pedi que meus homens não
vestissem a armadura, apenas levassem espada, algumas rações e nossa vestimenta
que nos identificava como templários.
O homem que íamos buscar vinha acompanhado de uma
caravana escoltada por seis cavaleiros e oito serviçais. Depois de muito seguir
os rastros na densa e traiçoeira trilha por mais um dia, finalmente encontramos
a caravana. Ou o que havia sobrado dela. Comigo estavam mais quatro cavaleiros
da ordem dos templários. Com um sinal dei a ordem para que parassem. Descemos e
prendemos nossas montarias nos troncos das árvores e fomos averiguar o que
havia ocorrido.
- Eles acamparam
aqui – anunciou Delos, nosso rastreador.
- Foram atacados?
– perguntei. A carroça usada para transportar o homem estava tombada de lado.
Nem sinal dos cavalos que a levavam. Malas e pertences foram deixados no local.
Revirei rapidamente uma mochila e achei uma pequena sacola que continha várias
moedas de ouro.
- Foram – respondeu.
– Há vários sinais de que um combate aconteceu aqui.
- Então por que
não levaram isso? – perguntei sacudindo o saquinho. As moedas tilintaram lá
dentro.
- Pressa talvez.
Os outros
cavaleiros fizeram um perímetro ao redor do local. Todos a postos a qualquer
sinal de perigo. Delos circulou o acampamento e examinou tudo meticulosamente.
Havia muitas pegadas no chão, de modo que quem quer que tenha feito aquilo
deixara rastros evidentes para que pudéssemos persegui-lo.
- Talvez sejam
ladrões de estrada – ele disse ainda circulando o local. – Difícil precisar um
número, mas deviam ser mais de dez. Vieram do norte.
- E dos
integrantes da caravana? – já sabíamos que houve um combate aqui, então deveria
haver feridos ou mortos e não estávamos vendo nenhum dos dois.
- Como não há nenhum corpo, o mais provável é que
tenham sido levados – ele dá a volta na carroça e fica por lá alguns instantes.
Aquele era o único local que não era visível para nós. – Tem um corpo aqui! –
ele disse e eu fui imediatamente averiguar.
- Deus do céu! – fiz o sinal da cruz quando vi
o cadáver.
Creio que era um
homem. Digo isso porque o cadáver está praticamente irreconhecível. Seja lá o
que fez isso com o pobre, não deixou muita coisa para contar história. O tórax
foi aberto de ponta a ponta e boa parte de seus órgãos internos havia sido
retirada. O rosto estava deformado, parecia ter sido desfigurado a dentadas.
Uma matilha poderia explicar a cena grotesca que eu presenciava. O rastro de
sangue seco seguia para o leste.
- Muito bem,
homens, vamos atrás dos responsáveis por isso – dei a ordem. Estávamos para
montar em nossos cavalos quando ouvimos barulhos de passos, seguidos de gemidos
que arrepiaram minha alma.
O som vinha de
todas as direções. Espadas foram desembainhadas e posicionadas para o combate.
Ficamos em círculo para cobrir todas as direções. Foi então que o sacerdote
Gregor surgiu do meio das árvores. Porém, havia algo errado. Suas vestes
estavam empapadas de sangue seco, havia uma marca de mordida enorme em seu
pescoço. Eu me lembrava perfeitamente de seus olhos verdes, mas o que eu via
agora eram duas órbitas leitosas desprovidas de qualquer coloração olhando
fixamente para mim. Ele balbuciava algo incoerente ou estava apenas grunhindo
de dor devido ao ferimento, poderia até estar se engasgando no próprio sangue.
Depois de alguns passos cambaleantes até nós, ele tropeçou em uma mala cheia de
objetos cerimoniais e caiu desengonçado no chão. Doravan, o médico de nosso
grupo, foi rapidamente até ele. Os outros mantinham espadas erguidas, pois os
gemidos não haviam cessado. Vi quando meu companheiro tomou o sacerdote nos
braços e rapidamente analisou sua ferida. Ele perguntou se o sacerdote podia entendê-lo,
apanhou um kit de primeiros socorros de sua bolsa e logo em seguida soltou um
grito animalesco que assustou a todos nós. O sacerdote havia mordido a jugular
de Doravan com tanta violência que arrancou um naco enorme fora. Samuel e Luan
foram ao seu auxílio. Samuel arrastou Doravan para longe do sacerdote, enquanto
Luan imobilizava no chão o sacerdote que a todo momento esperneava, grunhia e
tentava bater para escapar.
- Santo Deus!
Doravan está sangrando um riacho! – Samuel apanhou um pedaço de pano de uma
mala próxima e pressionou o ferimento. Em segundos ela estava completamente
vermelha.
- O que há com
esse desgraçado? – indagou Luan ainda segurando o corpo do sacerdote contra o
chão.
- Não estamos
sozinhos... – a voz de Delos vinha carregada de terror.
Só então olhei ao
redor.
Vinte, talvez
mais pessoas caminhavam a passos descompassados em nossa direção. Eles vinham
de todos os lados. Homens, mulheres, velhos e crianças. Todos com braços
levantados e bocas semiabertas. Eram eles que grunhiam alguns instantes atrás.
Deus! O que em nome do Pai aconteceu a essas pessoas? Todas tinham feridas em
alguma parte do corpo em maior ou menor grau. Uma garotinha estava com o braço
direito amputado. Um velho não tinha uma das pernas, arrastava-se pesadamente
contra nós. Com assombro vi que alguns deles eram templários. Um deles tinha
uma enorme lança cravada no peito e mesmo assim caminhava.
- Em nome de
nosso Santo Papa, parem onde estão! – eu ordenei com a espada em punho.
Eles não pararam.
- Doravan se foi,
senhor – anunciou Samuel. – Sacerdote maldito!
- Pare, Samuel! –
meu comando não surtiu efeito algum contra a cólera de meu amigo. Samuel
brandiu sua espada acima da altura de sua cabeça e avançou contra o sacerdote
Gregor.
Luan saiu do caminho no momento em que a arma
desceu contra as costas do sacerdote. A lâmina trespassou o corpo dele e
cravou-se no chão, mas para espanto de todos, ele não parou de se mexer, não
parou de tentar se levantar. Luan desembainhou sua espada e com um golpe em
riste perfurou o peito de um homem.
Aquele golpe teria levado ao chão o mais poderoso
dos guerreiros.
No entanto, o
homem não apenas ignorou o ferimento, como enterrando a lâmina ainda mais em
seu corpo. Estupefato, Luan deixou a lâmina correr até ficar cara a cara com o
homem que, sem perder um segundo sequer, agarrou firme sua cabeça e desferiu
uma mordida na altura do nariz. Ele rugiu de dor e tentou de todas as formas se
livrar da pegada, ambos indo para o chão em seguida. O homem continuava a
mordê-lo como um lobo faminto, arrancando pedaços de sua face. Samuel
enfrentava cinco daqueles monstros inumanos. Cada golpe que desferia arrancava
um membro, mas apenas retardava o avanço das criaturas. Que loucura! Esses
golpes teriam incapacitado qualquer pessoa normal. Delos foi cercado por uma
turba de mais de dez e caiu no chão, gritando de dor. Seu estômago foi aberto
com mãos nuas, às tripas indo ao encontro de bocas famintas. A voracidade
daquelas coisas era impressionante. Eles não se intimidavam com nada! Em nome
de Deus, aquelas coisas do inferno precisavam ser destruídas!
Com minha
espada em punho, fui fazer o que eu sabia fazer melhor: matar. O primeiro teve
a cabeça separada do corpo ao se aproximar de minha linha de ataque. O segundo
recebeu minha lâmina no estômago. O ataque horizontal abriu um talo enorme, jogando
intestino, fígado, sangue e tudo o mais que tinha dentro daquele homem para
fora, mas ele não parou de andar até mim, nem mesmo diminuiu o ritmo. O segundo
golpe foi de cima para baixo no topo de sua cabeça. Ele não tornou a se mexer
depois disso.
- Vocês são
templários! O que estão fazendo, seus idiotas!? – dizia Samuel afastando com
chutes seus antigos companheiros. Ele não queria matá-los e eu também não. Eles
eram cruzados! Eles eram servos de Deus. Estariam todos eles possuídos pelas
forças de Lúcifer?
A batalha estava
difícil. Não só éramos dois contra mais de vinte, como eles simplesmente não
caíam com nossos ataques... Exceto os dois que eu acabara de matar. Ao pensar
nisso, esquivei-me da investida de mais um e com um movimento em arco separei o
corpo da cabeça. Estava certo. Não entendia por que, mas apenas separando a
cabeça dos corpos éramos capazes de pará-los.
- A cabeça!
Arranque a cabeça desses malditos, Samuel! – gritei para ele, mas era tarde.
Ele foi cercado, dominado e executado.
Estava sozinho.
Depois que
descobri que apenas um golpe certeiro que separasse a cabeça do corpo era capaz
de enviá-los para os círculos mais obscuros do inferno, recuei com o propósito
atraí-los para o meio das árvores. Observei que eles pareciam não ter
consciência de quem foram ou do que estavam fazendo, suas ações motoras eram
tão precárias que muitos tropeçavam em locais que bastavam levantar o pé para
desviar e não conseguiam perceber que eu os levava para armadilhas, de forma
que foi relativamente fácil levá-los para as partes mais densas da floresta.
Matei um a um, até que não restou mais nenhum deles de pé. Um deles ainda
conseguiu me morder na mão, mas nada que algumas ervas medicinais não pudessem
resolver. Não sei que tipo de bruxaria usaram, mas com horror vi que algumas
cabeças ainda se movimentavam! Quando seus olhos sem coloração me fitavam, eles
abriam e fechavam a boca... Alguém abriu as portas do inferno, que Deus permita
que esta seja a última vez que criaturas assim pisem em nosso solo sagrado.
Recuperei os
documentos que o sacerdote Gregor trazia e agora cavalgo de volta a Roma. Nunca
irei entender o que realmente aconteceu aqui, o porquê daquelas pessoas terem
feito o que fizeram, atacando e matando cavaleiros templários, homens de Deus.
Enquanto cavalgo
de volta para minha terra, de volta para o meu amor, sinto o meu corpo arder em
febre. Devo ter contraído algum resfriado nessa minha última missão.
Logo chegarei a
Roma. Logo chegarei aos braços de minha amada.
Nossa, nunca li tanta coisa de zumbi em tão pouco tempo XD Ficou legal *o*
ResponderExcluirEle vai infectar todo mundo...
ResponderExcluirA começar pela amada. Se o vírus é transmitido pelo sangue, também deve ser sexualmente transmissível, eu acho...
ExcluirEi Luciano! Quando a gente clica em "Justificar", algumas linhas rebeldes insistem em não seguir as outras. Nesses casos, eu as corrijo manualmente mesmo, que são poucas. Mas se você achar um jeito melhor de consertar isso, por favor me diga!
Sim, o programa que justifica as linhas é besta e as vezes coloca códigos de espaço de mais ou de menos. Tem de arrumar manualmente ou ir no código fonte. Nem preciso dizer que manualmente é mais prático. Para evitar um pouco isso, escrava o que você quer escrever no Word primeiro. Não vai ficar 100%, mas já da uma melhorada.
Excluircaraaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa... ameiiiiiiiiiiiiiiiii... de verdade...
ResponderExcluirVlw Nanda :)
ExcluirLuciano, você só melhora a cada conto. Acredito muito no teu potencial e quero o teu primeiro livro com uma dedicatória especial. És um orgulho guri.
ResponderExcluirBj, Ale!
rsrs pra tu saber quem é: Alexandra Russi!
Excluir*-----------------------------------------* xD
ExcluirEu já imaginava que era você. Obrigado pelas palavras de apoio. Estou trilhando o caminho para escrever um livro e espero chegar lá um dia. :)
kkkk hiostória linda ,romântica, violenta, de luta, terror.. gostei da mistura, belo personagem esse apaixonado, bravo guerreiro rs..... Vocabulário 10, parabéns sempre melhorando!
ResponderExcluir